Capítulo 79 - Semelhança
“Ah, deixa disso, pensa melhor.” O Gordo deu uma tragada profunda no cigarro. Cocei a cabeça, de repente achando que a paisagem já não era tão bonita assim. Continuamos subindo enquanto eu refletia: aquele mapa tatuado parecia claramente o desenho de Ba Nai, mas por que era tão parecido com esta ilha?
Wang Zanghai já havia construído duas cidades idênticas, uma na costa e outra em Yunnan. Este lugar fica em Guangxi, um ponto geográfico simétrico, com terrenos tão semelhantes. Será que o relevo foi desenhado por Deus com pinceladas precisas?
“Será coincidência?” perguntei ao Gordo. Ele riu e respondeu: “Você não tem nada melhor para fazer, então pesquisa isso como um passatempo.”
“E você, não tem uma conclusão preliminar ou algo do tipo?” perguntei. “Pelo jeito que você fala, parece que já pensou muito nisso. Ou tem alguma informação privilegiada?”
“Nem de longe”, disse o Gordo, confessando que também ficou surpreso ao perceber isso. Ele olhou o endereço, conferiu os números das casas e me disse: “Pensa assim: a família Zhang talvez tenha investigado essa ilha. O prédio antigo de Ba Nai foi construído depois, mas essa ilha já existia há muito tempo. Talvez um ancestral dos Zhang tenha vindo aqui, gostado do lugar e decidido que todo Zhang Qiling deveria tatuar isso na sua pele.”
Eu pensei que podia ser mesmo. A família Zhang tinha muitos mistérios não resolvidos. Enquanto ponderava, o Gordo chegou em frente a uma casa simples, conferiu o número e disse: “É aqui.” Bateu na porta e começou a cantar: “Eu sou uma maçãzinha, pequenina…”
Cantou algumas frases, e a porta se abriu. Uma mulher de meia-idade, um pouco gordinha e sorridente, nos recebeu. Ela olhou para nós e disse: “Vocês chegaram?”
O sotaque dela era compreensível, e tanto eu quanto o Gordo ficamos aliviados. Ele mostrou algo no celular, ela olhou por cima do nosso ombro e nos convidou para entrar.
Atrás da casa havia um pátio cheio de sacos de ráfia e caixas de papelão. Parecia uma oficina improvisada para empacotar caixas de fábrica. Em algumas vilas, as famílias ajudam fábricas de alimentos ou produtos leves montando embalagens em casa. Cada caixa rende alguns centavos, e os mais habilidosos conseguem complementar a renda.
Observei as embalagens e percebi que eram caixas de doces. Passamos pelo pátio e entramos no quarto onde a família dormia. Havia dois quartos laterais e uma sala pequena no meio, que funcionava como sala de jantar. Não havia mais saída.
Antes que eu pudesse procurar por algo, a mulher afastou um armário antigo cheio de talheres. Atrás havia uma porta coberta por uma cortina grossa. Ao levantá-la, um novo pátio apareceu diante de nós.
O que me surpreendeu foi que o lugar estava cheio de pessoas. Onde não havia gente, havia montes de porcelanas cobertas de conchas do mar. Algumas pessoas limpavam as peças enquanto outras, clientes, examinavam e negociavam em silêncio.
“Que lugar grande”, comentou o Gordo, me lançando um olhar. Eu pensei que seria uma negociação discreta, mas parecia um mercado atacadista.
A mulher pegou um caderninho, escreveu dois números “12” e rasgou uma das folhas para mim. Prendeu a outra metade num cesto e nos disse: “Coloquem o que gostarem no cesto. Depois de pagar, lavamos para vocês de graça.”
Fiquei um pouco surpreso. Olhei para o Gordo, que resmungou: “Parece que estamos pedindo comida por quilo.” A mulher nem ligou e saiu. Começamos a caminhar entre os montes de porcelanas sujas. Como eu não estava interessado, deixei o Gordo escolher enquanto fui observar um idoso lavando peças. Pelo jeito habilidoso dele, percebi que fazia isso há décadas.
Nas regiões costeiras, muitos têm empregos paralelos. Mas quem realmente vive disso são os veteranos, os “chefes de campo”. Eles devem saber muito sobre as histórias locais. Como havia poucas pessoas ao redor dele, me aproximei para vê-lo trabalhar. Ele olhou para mim, e eu para ele. Perguntei: “Essa habilidade deve ter uns 30 anos, né?”
“Cinquenta”, respondeu com um sotaque forte, mas compreensível. Tentei puxar papo: “E já passou essa arte para alguém? Seria uma pena perder essa habilidade.”
Ele balançou a cabeça. “Não é uma pena. As coisas do mar estão acabando.”
Capítulo 80 - Lavando Porcelana slot
O idoso olhou para minha calça, que ainda era do hospital. Ele continuou em silêncio, lavando as peças na enorme bacia diante dele. Ao lado, havia um cesto com as peças limpas.
Pensei que ele podia ser introvertido ou apenas cauteloso. Se fosse do segundo tipo, seria difícil conseguir informações. Mas, se fosse introvertido, eu tinha uma estratégia para me aproximar. Olhei para as peças que ele havia lavado e sugeri: “Senhor, você parece ser o melhor aqui. Pode lavar as peças que meu amigo escolheu?”
Ele balançou a cabeça. “Não dá. É tudo distribuído de forma justa.”
“Mas o senhor faz um trabalho tão bom”, insisti. “Eu pago a mais. Posso falar com o chefe. Quem é o responsável aqui?”
Sem levantar o olhar, ele respondeu: “Não dá. Se todo mundo fizesse isso, ninguém mais teria trabalho, e eu acabaria morrendo de tanto lavar.”
“Então não vou comprar nada”, retruquei. Ele me olhou de relance, depois para os outros ao redor, e riu: “Se você não comprar, não posso te forçar, certo?”
Olhei ao redor, depois para o homem novamente, e de repente percebi que havia interpretado mal. Isso me deixou desconfortável. Antes, eu costumava entender tudo com uma única olhada. Agora, parecia preguiçoso demais para tentar. slot
Esse senhor, com sua calma e habilidade, claramente era o mais experiente ali. E eu ainda estava perguntando quem era o chefe. Ele era o dono daquele lugar, escondido em meio aos trabalhadores, fazendo o serviço mais básico. Os outros lavadores talvez nem soubessem que trabalhavam para ele.
Velho especialista do mar, sábio e discreto. Não é à toa que ele se manteve por 50 anos sem problemas.
Puxei uma cadeira e me sentei ao lado dele. Ele continuou indiferente, focado no trabalho. Disse em tom baixo: “Quanto ainda tem no mar? Eu compro tudo. O senhor pode me dar um tratamento VIP?” slot
Ele sacudiu uma peça para escorrer a água, ignoran do minha pergunta. Coloquei a mão em sua perna e apertei de leve. “Eu sei como funciona. Me manda o preço pelo WhatsApp.”
Ele olhou para minha mão, que logo tirei. Ele então perguntou: “WhatsApp? Só lavo as peças. Quer comprar, fale com o chefe.”
Fiz um gesto de entendimento e perguntei: “Por falar nisso, o senhor sabe por que essa ilha se chama Ilha do Qilin? Já ouviu alguma lenda sobre isso?” Apontei para o Gordo. “Meu chefe quer saber.”
Ele secou as mãos no avental e perguntou: “De onde você é?”
“Hangzhou.”
“E você sabe por que Hangzhou se chama Hangzhou?”
Fiquei sem resposta. Alguém chegou para pegar um cesto, e ele passou as peças lavadas. Depois, me enxotou: “Você sentado aqui só me atrapalha. Sai daqui!” E jogou água suja para o meu lado.
Pulei para evitar a água, frustrado. Não era introvertido, mas muito cauteloso. Claro, um veterano de 50 anos não seria ingênuo. Que tolice minha.
Voltei para o Gordo, que havia escolhido sete ou oito cestos de peças. Olhei os preços e percebi que ele gastaria quase tudo que tinha. Alertei para ele pegar leve, já que o mercado de porcelanas marítimas estava instável. Ele deu de ombros e pagou.
Voltamos para o hospital com as peças embrulhadas em papel de peixe seco. Lá, encontramos pessoas do Segundo Tio nos ajudando a dar alta.
Depois, nos mudamos para uma pousada à beira-mar, que custava apenas 40 yuans por noite. O lugar era praticamente uma sala de jogos. Lá, vi Liu Sang.
Ele estava sozinho, na varanda do hotel, olhando o mar. Não havia sinal do Segundo Tio ou do Cara Trancado. Segundo os ajudantes, eles estavam na praia, esperando algo. Caminhei até Liu Sang. O Gordo deu um chute nele e disse: “Você tem coragem de aparecer aqui, hein?”
Liu Sang, sem desviar os olhos de uma linha preta no horizonte, respondeu: “Vai chover logo.”
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